INTRODUÇÃO
I. Deus, objeto primeiro da Teologia
Sto Tomás: necessidade uma doutrina fundada na revelação
@ o fim do homem: sua salvação
@ falta de clareza para chegar ao conhecimento de Deus, devido aos muitos erros. Revelação como instrução (Conc. Vat. I: Dei Filius – cf. Ds 3.004-3.005).
Revelação:
@ auto-comunicação de Deus
@ conhecimento pela fé-sacra doutrina-teologia
@ objeto: o próprio Deus e os decretos eternos de sua vontade acerca da salvação dos homens.
Plenitude do conhecimento de Deus por Jesus Cristo
Textos capitais:
Jo 1,14.16-18
@ O Verbo se fez carne
@ A graça e a verdade vieram por Jesus Cristo
@ A Deus nunca ninguém o viu
@ O Filho único, que está no seio do Pai, deu-O a conhecer
Ex 33,20; 1Tm 6,16 – Vindo ao mundo, Jesus nos revelou Deus
@ O homem não pode ver-me e continuar vivendo
@ Deus habita em uma luz inacessível a todo ser humano
Como Jesus nos revelou o Pai?
@ Fazendo-nos participantes de sua vida
@ Dando-nos de sua plenitude
@ Comunicando-nos sua graça e verdade
Obs.: Ele não só nos comunicou “verdades”, mas ele próprio fez doação de sua própria vida. A fé, portanto, é a atitude fundamental para o acesso a essa revelação divina.
Jo 14,6-9
@ Em Jesus vemos o Pai
@ Temos o único caminho para chegar até ele
Conhecimento de Deus a partir da criação e na História da Salvação
Concílio Vat. II, DS 3 – Conhecimento de Deus a partir da criação vem do testemunho perene que Deus dá de si.
Dei Verbum 3 – há uma manifestação divina a nossos primeiros pais, de nível mais elevado do que a criação mesma, com relação com a salvação de uma ordem superior a que os destinava. Revelação ao povo escolhido, como “Deus único, vivo e verdadeiro; Pai providente e justo Juiz”.
Dei Verbum 4 – Porém, só com Jesus Cristo a revelação chega à sua plenitude, porque o Verbo, que ilumina a todos os homens, foi enviado pelo Pai para que “habitasse entre eles e lhes revelasse os segredos de Deus”.
1Cor 12,3 – Tal mistério só será possível pelo Espírito Santo
II. Originalidade da noção cristã de Deus
O cristianismo:
@ coloca-se ao lado das grandes religiões monoteístas
@ segue a tradição do Antigo Testamento
@ considera-se legítimo herdeiro da religião de Israel, em que a unidade e a unicidade de Deus são a verdade fundamental (cf. Ex 20,1ss; Dt 6,4; Mc 12,29; Jo 17,13).
Obs. Para o Islamismo, a Trindade cristã é um desvio.
A fé cristã:
@ Monoteísmo cristão: Deus trino
@ Unidade de Deus em si mesma plural
@ Deus Uno pode ser conhecido pela razão
@ Deus Trino, objeto da Revelação
@ Unitas in Trinitate et Trinitas in unitate
@ A revelação do AT é parte integrante da mensagem cristã, ainda que só à luz de Jesus Cristo receba seu sentido definitivo
@ Em muitas tradições culturais e religiões há as sementes do Verbo, raios da verdade e presença do Espírito.
@ Deus pode ser conhecido pelas obras da criação (Sb 13,1-9; Rm 1,19-23), que podem levar com a luz da razão à certeza de sua existência (cf. DS 3.004)
@ O mistério de Deus, em sua profundidade, só é conhecido com a revelação cristã em que Jesus nos diz tudo o que ouviu de seu Pai (cf. Jo 15,15). Com base no mistério trinitário é compreensível a encarnação, que Deus assuma a natureza humana, menos o pecado (cf. Hb 4,25), até a morte, e morte de cruz (Fl 2,6-11).
@ É um confronto com um mistério: o Deus uno e trino. Temos em Jesus a revelação do mistério de Deus, quando contemplamos a glória que lhe corresponde como unigênito do Pai (cf. Jo 1,14). E o mistério do amor de Deus é o conteúdo fundamental da revelação divina.
Jesus Cristo:
@ Revelação do mistério de Deus
@ Plenitude da Sabedoria e do Conhecimento (cf. Cl 2,2-3)
@ Enviado pelo Pai por causa do seu amor ao mundo (Jo 3,16), como dom de si, dando sua vida por nós.
A grande definição de Deus:
1Jo 4,8.16: “Deus é amor”. A dimensão do amor é-nos oferecida pelo Deus revelado em Cristo como dom de si.
Resumindo: Cathechismus Catholicae Ecclesiae:
@ O mistério da SS. Trindade é o mistério central da fé e da vida cristãs;
@ É o mistério de Deus em si mesmo;
@ É... a fonte de todos os outros mistérios da fé, a luz que os ilumina;
@ É o ensinamento mais fundamental da “hierarquia das verdades” da fé;
@ A história da salvação é a mesma história do caminho e do modo com que o Deus verdadeiro e uno, Pai, Filho e Espírito Santo, se revela aos homens, separados pelo pecado, e os reconcilia e os une a Si.
III. Caráter central da fé no Deus uno e trino
Retomando, a fé nos diz;
@ que Deus é o único fim do ser humano
@ que a originalidade do conceito cristão de Deus está baseada em sua característica última de ser o Deus amor, na unidade da Trindade.
Mt 28,19: Relevância da fé no Deus Uno e Trino – Fórmula batismal
@ Antigas profissões de fé, símbolos, têm estrutura trinitária: Símbolo dos Apóstolos e Niceno-constantinopolitano.
@ A Trindade está no lugar central da liturgia cristã, na celebração eucarística e dos demais sacramentos. Na oração eucarística, na doxologia; na forma de louvor: ao invés de “glória ao Pai pelo Filho, no Espírito Santo, para evitar subordinacionismo, usamos com mais frequência, “Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo”, sublinhando a igual dignidade das três pessoas.
@ Centro da vida da Igreja: “Assim se manifesta toda a Igreja ‘como uma multidão reunida pela unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo’” (LG 4).
@ Pertencer ao centro da consciência cristã.
IV. “Esquecimento” da Trindade: racionalismo da fé
@ Catequese e pregação infelizes no Ocidente: o mistério incompreensível.
@ A Ilustração buscou a razão universal, criticou a religião histórica e concretamente o cristianismo, impondo questões complexas a partir do mistério trinitário. Questões como: Como poderia a salvação de todos depender de um acontecimento concreto que muitos não chegaram a conhecer e nem tiveram a possibilidade mais remota de fazê-lo? Não é injustiça da parte de Deus, que deixa que grande parte dos homens ignorem Cristo?
@ Immanuel Kant: “A religião dentro dos limites da pura razão”. Ele afirma que a Igreja deve ser algo universal, e que não pode fundar-se sobre uma revelação histórica, que será necessariamente particular. Aqui reside o racionalismo.
@ A crise da idéia racional de Deus conduziu ao ateísmo.
@ A crise ariana.
V. Estrutura do tratado
@ O ponto de partida é a revelação de Deus em Cristo
@ Depois, o De Deo Uno
DEUS EM SI MESMO E DEUS PARA NÓS (TRINDADE IMANENTE E TRINDADE ECONÔMICA).
@ A “economia” é o único caminho para o conhecimento da “teologia”
@ A “Trindade econômica é a Trindade imanente, e vice-versa” (Axioma fundamental) – K. Rahner
O Deus Uno e Trino do qual tudo procede não está longe de nós nem de nosso mundo.
“As sementes do Verbo”, os fragmentos da verdade que o Logos derramou no mundo têm a ver com a Trindade, ainda que não dêem a conhecer explicitamente.
“A Deus ninguém o viu, o Filho unigênito que está no seio do Pai no-lo deu a conhecer” – Jo 1,18; 1Tm 6,16.
O conhecimento do Deus trino, enquanto verdade de fé, só nos é acessível, portanto, pela revelação feita por Jesus, porque nele é o Deus mesmo que se revela.
O Deus que se revela mostra-se a nós tal como é.
A revelação cristã é a revelação de Deus e de seu desígnio salvífico, por Jesus Cristo (DV 4).
Em toda atuação de Deus fora de si, AD EXTRA, agem uinitariamente as três pessoas divinas.
Deus é um só princípio da criação e da história da salvação, não poderemos nunca falar de três princípios. Se bem que o único princípio não é indistinto, de modo que às distintas pessoas divinas “apropriam-se” modos de atuar que mais diretamente correspondem ao que é “próprio” daquela pessoa na vida interna de Deus – Doutrina das “apropriações”. Só pela revelação torna-se cognoscível.
A Encarnação é um caso da atuação de Deus AD EXTRA em que as pessoas divinas atuam diferentemente. Também toda a vida de Jesus na terra é ação diferenciada das três pessoas e, ainda, a ressurreição e exaltação à direita do Pai e no dom do Espírito Santo. O Pai é aquele que envia: cf. Jo 3,17.34; Rm 8,3; Gl 4,4. No Espírito é possível: cf. Lc 1,35; Mt 1,20; DS 150.
Durante séculos foi doutrina comum que qualquer das pessoas divinas poderia ter-se encarnado, embora sempre se tenha insistido na “conveniência” da encarnação do Filho (Boaventura e Sto Tomás). Ora, essa opinião dista hoje muito de ser pacífica, ou de poder considerar-se definitivamente provada.
A Encarnação do Filho indica que Ele é, em si mesmo, o revelador do Pai, ao ser sua imagem perfeita (cf. 2Cor 4,4; Cl 1,15; Jo 1,18; 14,9)
Duas razões importantes:
a. A S. Escritura não nos oferece suficiente apoio para especulações.
b. Para Sto Tomás, a encarnação poderia ter acontecido com qualquer pessoa divina, devido a ratio personalitatis, que é comum nas três pessoas.
Conclusão: A Encarnação revela o modo de ser trinitário, cabendo ao Filho o “ser enviado”.
13. Deus se nos comunica tal como é em si mesmo. Deus se nos dá em si
mesmo, não nos dá simplesmente dons.
Identidade entre Trindade imanente e econômica
@ A comunicação econômica da Trindade imanente é gratuita e livre. O termo identidade não significa que a Trindade imanente só exista na economia.
@ A Trindade imanente comunica-se livre e graciosamente na economia da salvação.
@ A Trindade imanente não se realiza nem se dissolve na economia. A Trindade imanente é o fundamento transcendente da economia da salvação. Tem em si mesma a plenitude, independentemente da criação e da obra salvífica.
@ O filósofo Hegel quer compreender o mistério da Trindade dialeticamente pela filosofia, o que trará para ele uma séria confusão. Segundo ele, Deus é espírito, absoluta atividade, ato puro, plena subjetividade. A Trindade significa que Deus, a subjetividade infinita (o Pai, a tese), compreende em si a contradição (a objetivação de si mesmo: o Filho, antítese) e ao mesmo tempo a solução, a diferença e a anulação dessa última (o Espírito Santo, a síntese). Entende-se que Deus não é sem o mundo: pertence à sua essência ser o criador do mundo. Não há vida ad intra sem atividade ad extra, as processões e as missões temporais não se distinguem sempre com clareza. Há realmente evidência de panteísmo na doutrina hegeliana. Hegel torna-se ambíguo na sua colocação quando compreende uma plenificação trinitária na economia divina, isto é, como se Deus necessitasse da criação para ser pleno.
@ O Concílio Vaticano I (DS 3024) condena o panteísmo em todas suas mais variadas formas na Constituição Dei Filius.
@ O mistério de Deus trino transcende a criação. E este mistério só pode ser alcançado pela Revelação de Jesus Cristo, que não é a contradição do Pai, mas a revelação absoluta de Deus. Só temos acesso ao mistério trinitário através de Jesus Cristo.
@ A Trindade imanente não se identifica com o desenvolvimento da economia da salvação nem se “dissolve” nela, tampouco se “esgota” na dispensação salvadora em que livre e gratuitamente se comunica. Em sua auto-comunicação salvífica Deus nos faz ver mais de perto seu mistério insondável, não o elimina. Só na consumação escatológica Deus se dará a conhecer plenamente em sua autodoação total, e o veremos face a face, tal como é (cf. 1Cor 13,12; 1Jo 3,2).
@ A auto-comunicação de Deus comporta um elemento de Kênosis e de cruz, de esvaziamento. Aqui supomos uma distinção entre a Trindade econômica e a imanente. Na economia, Jesus aparece na forma servi. A Ele já pertence a forma Dei.
@ O ser de Deus não se realiza nem se aperfeiçoa na sua auto-comunicação. Seu mistério é mantido nessa revelação. Sua maior aproximação conosco significa a manifestação mais direta de sua maior grandeza, o que Ele é em si mesmo. Deus ocupa-se como o mundo como Deus, “não se converte no amor pelo fato de ter o mundo como um tu ... senão porque já em si mesmo e por cima do mundo é amor”2. Segundo o documento da Comissão Teológica Internacional: Teologia, cristologia, antropologia, “A Trindade não se constituiu simplesmente na história da salvação pela encarnação, a cruz e a restauração de Jesus Cristo, como se Deus necessitasse de um processo histórico para chegar a ser trino”.
@ Portanto, não há duas trindades, mas um só Deus trino enquanto é em si mesmo e enquanto é para nós. Na Trindade em si mesma está todo o fundamento, a razão e a possibilidade da economia salvadora. Na história, a Trindade imanente age, segundo a Comissão Teológica, de um modo “quase novo” para nos conduzir à plenitude da comunhão com o Pai, pelo Filho, no Espírito Santo. Quase novo no sentido de que Deus assume o acontecimento kenótico da encarnação e da morte do Filho. Acontecimentos estes assumidos na vida do Filho, afetam o ser próprio de Deus Pai, que não pode deixar de viver como próprios, com o Filho e o Espírito Santo, os acontecimentos da vida temporal do Filho encarnado. Isso significa que a vida da Trindade, que não é constituída por esses acontecimentos, se vive a partir deles de um modo “quase novo”. A novidade está em que nas relações constitutivas da Trindade entrou o Filho enquanto homem, Jesus, que nasceu, morreu e ressuscitou. Deus vive os mistérios salvíficos como próprios, não como alheios. Os mistérios salvíficos são mistérios próprios de Deus. Mais uma vez afirmamos que a Deus nada é acrescido com a revelação na história enquanto Deus é a perfeição em si mesmo. Antes de criar e salvar a Trindade é Deus absolutamente perfeito.
DEUS SE REVELA NA VIDA DE JESUS CRISTO
@ A revelação histórica de Deus chega ao seu cume nas “missões” do Filho e do Espírito Santo (cf. Gl 4,4-6). Tanto o Filho como Espírito Santo foram enviados por Deus, o Pai, mas caracteristicamente cada missão na sua especificidade. Embora as duas missões possuam uma mútua relação. O Espírito continua nos corações a obra de Jesus Cristo, tornando cada fiel participante da realidade para qual Jesus se entregou. A missão do Filho coincide com a encarnação, sua entrada na vida humana para partilhar da mesma vida e história, e ainda para salvar toda a criação; a missão do Espírito tem caráter de continuidade e invisibilidade (cf. At 2,1ss; 4,31; 10,44-46). É do Espírito o fazer acontecer, em cada pessoa humana, a revelação por Jesus Cristo.
Deus, o Pai, tem a iniciativa da missão por amor:
- envia o Filho: 1Jo 4,9; Jo 3,16
- revela-se com a aparição histórica do Filho.
I. Deus, o Pai de Jesus
a. Deu-se a conhecer como o Deus da Aliança;
b. Deu-se a conhecer como o Deus criador – o Deus de tudo e de todos.
c. Revelado por Jesus como o Pai.
d. Identificado como Deus de Israel3
e. Sua paternidade é relativamente utilizada para se referir a Ele no AT.
Paternidade de Deus
1. Paternidade como criador (Ml 1,6; 2,10; Is 45,10s; Sl 29,1; 84,7.
2. Paternidade para com o povo escolhido para si4:
- menos universalista;
- a partir da libertação do povo das terras do Egito;
- mediante a aliança;
- quando faz concessão da terra prometida;
- considerando o seu povo como filho primogênito5;
- quando manifesta piedade pelos seus6;
- é Pai totalmente amor (Is 49,15).
3. Paternidade de Deus na Literatura Sapiencial
- Deus como Pai aparece com mais frequência em épocas relativamente tardias em Israel;
- O AT evita concepções demasiado literais ou materiais da paternidade divina. Motivos: transcendência de Deus e inadequação de nossos conceitos para se referir a Ele.
- com pessoas concretas7;
- No judaísmo palestino do segunda metade do século I d.C. aparece uma inovação em relação tanto aos indivíduos como a comunidade, mas normalmente acompanhada de outros títulos que diluem de certo modo seu significado.
- com relação ás pessoas concretas, nos tempos anteriores a Jesus, parece não acontecer com frequência essa inovação.
4. Paternidade de Deus na vida de Jesus Cristo
- é central;
- fala de Deus como seu Pai e o invoca como seu Abbá;
- tem consciência de proximidade com Deus: consciência filial;
- usa o termo ABBÁ, (Mc 14,36; Rm 8,15; Gl 4,6) – aramaico.
O Evangelho segundo João: Jesus Cristo na sua relação o Pai
O PAI
a. O Pai é aquele que enviou Jesus ao mundo8.
b. Do Pai “vem” Jesus9.
c. O Pai o marcou com seu selo: Jo 6,27.
d. O Pai, por Jesus Cristo, mostrou seu amor pela humanidade10.
e. O Pai é aquele que Jesus – conhece: Jo 10, 15
- dá a conhecer: Jo 14,8; 1,18; 12,45; 17,6.26
- obedece: Jo 4,34; 5,19s; 6,38-40
- pelo qual vive
- e torna os homens participantes dessa mesma vida11.
- para o qual volta: Jo 13,1; 14,28; 17,4-5; 20,17
f. O Pai deu a Jesus o poder que tem: Jo 5,19s
g. O Pai dá testemunha a favor de Jesus: Jo 5,37
h. O Pai ama o Filho e por Ele é correspondido: Jo 3,35; 5,20; 14,31; 15,9
i. O Pai ama os que seguem os mandamentos de Jesus: Jo 14,21s
j. O Pai é o que glorifica o Filho: Jo 17,1ss
l. O Pai e o Filho, unidade perfeita. Todos os fiéis são chamados para essa unidade: Jo 30,10; 17,21
m. Jesus intercede perante o Pai por todos nós, uma vez que ressuscitou e subiu aos céus: Jo 14,13.16; 16,24ss; 1Jo 2,1; Rm 8,34; Hb 4,14ss; 7,25; 9,24
n. O Pai é o constante ponto de referência de Jesus Cristo.
o. O Deus cristão não é senão o Pai de Jesus: Ef 1,2-3; 1Pd 1,3;
p. Jesus é o Filho por antonomásia, o “Filho Unigênito” – Jo 1,14.18; 3,16.18; 1Jo 4,9.
O FILHO
A finalidade do Evangelho de João é mostrar que Jesus é o Filho de Deus. Se bem que esse título não foi usado com tanta frequência pelo próprio Jesus. Em alguns casos sim, como, por exemplo, (cf. Mt 11,17 e par.). Verdadeiramente, o fato de não ter sido tão expressamente usado por Jesus, dá-nos a entender que a preocupação de Jesus era pregar a vontade do Pai e não pregar a si mesmo. E isso aconteceu certamente!
Nos sinóticos, Jesus é proclamado Filho de Deus:
@ no batismo, pelo próprio Pai – Mc 1,11 par.
@ na transfiguração, também o Pai – Mc 9,7 par.
@ Pedro indica a filiação de Jesus - Mt 16,16; Mc 8,29; Lc 9,20
@ O diabo também, para tentar Jesus, diz “Se és Filho de Deus...” – Mt 4,3.6; Lc 4,3.9.
@ O centurião, por ocasião da morte de Jesus na cruz, também proclama Jesus Filho de Deus – Mc 15,39; Mt 27,54.
Cartas Paulinas – 1Ts 1,10; Rm 1,3.4.9; 8,3.29.32; 1Cor 1,9; 15,28; Gl 1,15s; 2Cor 1,19; Ef 4,13; Cl 1,13
No título Filho de Deus está a identidade última de Jesus, posto que põe em evidência a relação única entre Ele e Deus, seu Pai. Em algumas de suas cartas, S. Paulo usa tal título para expressar a condição de glorificado em que Jesus se encontra na sua relação com a comunidade. Paulo entende a relação de Jesus com Deus na forma de uma relação filial. Em Paulo tal afirmação fortalece a tese da mediação salvífica de Jesus.
No começo da vida pública de Jesus já existe a afirmação da filiação de Jesus, conforme Mc 1,1l; depois em Lc 1,35. Se bem que a cristologia primitiva viu a plena realização dessa filiação divina na glorificação de Jesus como Senhor12.
Deus, Pai dos homens
A paternidade de Deus mostra-se-nos na missão de Jesus, o Filho, ao mundo. Essa, segundo Gl 4,4-6, tem como finalidade que os homens recebam a filiação. O envio do Filho e a filiação divina dos homens estão por isso em relação íntima. Jesus ensina que Deus é “Pai nosso” (Mt 6,9; 11,2) e também afirma que Deus é “vosso Pai” (cf. Mc 11,25; Mt 6,32; Lc 12,30; Mt 5,48; Lc 6,32; 12,32; Mt 23,9).
A filiação divina de Jesus e a dos discípulos nunca se equiparam. A relação de Jesus com o Pai é única e irrepetível. E ainda, Jesus Cristo é Filho por natureza enquanto que os discípulos o são por participação ou por adoção, através do mesmo Jesus Cristo. A filiação divina de Jesus e a nossa tem como vínculo, segundo Paulo, o Espírito Santo. É o mesmo Espírito que clama em nós “Abbá” (Gl 4,6), ou o que nos faz dizê-lo (Rm 8,15). Alguns textos bíblicos refletem essa relação13.
Nos escritos de João, de modo particular sua primeira carta, encontramos também que os crentes nasceram de Deus ou foram engendrados por ele. Deus é, portanto, também Pai dos que crêem em Jesus por esse novo título, por terem sido engendrados por sua ação à vida da fé (cf. Jo 1,12s; 1Jo 2,29; 3,9; 4,7; 5,14.18). É importante também meditar no nascimento do alto pelo Espírito Santo em Jo 3,3ss.
@ A filiação divina, que já é real, será em sua plenitude um dom escatológico (cf. 1Jo 3,2).
@ Deus é portanto Pai, porque desde toda a eternidade é o Pai do Filho, mas também é Pai enquanto é o princípio de uma maneira muito real, da vida eterna dos homens mediada por Jesus (cf. Jo 6,57; 15,9; 20,17).
@ A paternidade de Deus no NT adquire dimensões universais. A rigor, só a Deus convém o nome de “Pai” (Mt 23,9), Ele que tem, segundo Paulo, a paternidade para com todas as coisas (cf. Ef 3,14; 4,6; Rm 3,29-30; 1Cor 8,6).
@ A paternidade paradigmática de Deus funda-se em sua relação com Jesus e na filiação divina desse.
OBRA TRINITÁRIA NA VIDA DE JESUS
1. A Encarnação
Trinitariamente, porque depois da Páscoa, foi feita a releitura da vida de Jesus Cristo, o qual, por iniciativa do Pai, na força do Espírito Santo, se fez carne e habitou entre nós (cf. Jo 1,14; Lc 1,26s; 1,35).
- Realizada por obra do Espírito Santo – Mt 11,20; Lc 1,35
- Desde o momento da encarnação o Espírito Santo está presente na vida de Jesus.
- Sua origem nessa peculiar ação de Deus mostra o caráter transcendente, divino, da pessoa mesma de Jesus.
- A ação criadora do Espírito de Deus – Gn 1,2; Sb 1,7 – alcança aqui seu ponto mais alto. O Espírito Santo, ao descer sobre Maria, faz possível a encarnação do Filho. Neste sentido sua ação “precede” a do Filho. Por outra parte, tudo parece indicar que o Espírito Santo está presente na humanidade de Jesus, criada pelo fato mesmo de sua assunção pelo Filho na união hipostática. Desse modo a presença do Espírito há de ser considerada logicamente (não cronologicamente) “posterior” à união hipostática por parte do Filho.
2. O Batismo de Jesus
Inegavelmente, para o NT Jesus é o Filho de Deus, o Unigênito, que, em sentido estrito, não comparte com ninguém essa condição filial. Se bem que Ele é também o “ungido”, como o Espírito, o “Messias”, o “Cristo”. Portanto, Ele é o Filho e o Ungido, o portador do Espírito.
Jesus é apresentado como enviado e como Filho de Deus, a Israel, e vem dotado da força do Espírito necessária para o cumprimento de sua missão, uma força que corresponde à relação única que o une com Deus. Para o NT, o momento do batismo de Jesus é de uma importância capital. Jesus foi ungido com o Espírito Santo em vista de sua missão, que continua e leva a cumprimento a dos profetas. Jesus aqui é ungido como Messias Servo, conforme a “Voz” o indica no momento, relendo as palavras do profeta Isaías (cf. Is 42,1; Mc 1,11; 1,19ss; Mt 3,13-17; Lc 3,21s.
O NT conhece dois momentos, cronologicamente diferenciados: a encarnação de Jesus por obra do Espírito Santo, em virtude da qual ele já é “santo” desde o primeiro momento, e a unção, localizada no Jordão, a partir da qual Jesus, proclamado solenemente Filho de Deus. Filho aqui não quer dizer no sentido adocionista, mas que Jesus toma consciência de sua filiação eterna. Ele é o eternamente gerado do Pai. É Filho consubstancial ao Pai, como veremos adiante. Essa unção significa em primeiro lugar que Jesus recebe sobre si o Espírito que vai ser dado à Igreja14.
É preciso que analisemos o seguinte: a identidade de Jesus que é ungido, que é o Verbo de Deus, não um simples homem. Mas por outra parte é ungido em sua humanidade, não enquanto Deus, pois enquanto tal é claro que não necessitava de unção. Tampouco enquanto homem necessitava Jesus do batismo para o perdão dos pecados. Mas isso não quer dizer de nenhum modo que o batismo e a unção não tenham para Jesus mesmo nenhum significado. Irineu aponta, como escrito no rodapé, que Jesus há de receber a unção para poder cumprir sua missão, para evangelizar os pobres (Is 61,lss). Unção esta que está destinada, conforme Santo Inácio de Antioquia, à Igreja, aos homens. Nesta unção há uma verdadeira manifestação trinitária segundo Santo Irineu: O Pai é o que unge, o Filho, o que é ungido, e o Espírito, a unção.
Essa rica teologia da unção de Cristo vai desaparecer logo cedo. Por não entender bem tal teologia, alguns grupos se rebelaram quanto à reta compreensão da fé trinitária em Jesus: os adocionistas e os arianos. Se bem que as formas extremas da cristologia antioquena também propiciaram uma subvalorização da presença do Espírito Santo em Jesus.
Talvez essa corrente de pensamento se insinue já desde o instante em que se deixa de acentuar a dimensão trinitária da unção (o Pai unge a Jesus com o Espírito) e se começa a afirmar que é o Filho enquanto Deus que dá a humanidade assumida o Espírito que lhe pertence enquanto Deus. Gregório de Nazianzeno afirma que “É Cristo (Ungido) por causa de sua divindade; essa é a unção da humanidade que a santifica, não por operação, como nos outros ‘ungidos’, senão com a presença total daquele que dá a unção, e por obra dessa presença o que unge é chamado homem e o ungido é chamado Deus”.
Está claro aqui uma verdadeira redução da unção de Cristo à união hipostática. Já não é o Espírito que unge o Verbo feito homem, mas a divindade é que unge a humanidade. A ideia da unção de Jesus com o Espírito Santo praticamente desapareceu no Ocidente. A unção não é outra coisa do que a plenitude da divindade do Logos que se une à humanidade e vive realmente nela.
Posições recentes
1. Jesus teve, portanto, desde o primeiro instante de sua encarnação, a plenitude do Espírito Santo e a plenitude da graça.
2. O Espírito Santo que vem sobre Jesus no momento de sua encarnação é o Espírito Santo do qual o Filho é origem.
3. Não se concede ao momento do batismo mais valor que o de uma promulgação pública do que existiu desde o momento da encarnação.
4. Deve-se manter a distinção fundamental entre a encarnação e a unção, que recolhe um aspecto relevante da tradição. Jesus é o Filho de Deus encarnado, já que é o “Cristo”, o ungido, o portador e doador do Espírito.
5. A atuação do Espírito Santo sobre Jesus é um dado evidente no NT. É o Espírito que opera a encarnação do Filho e, na economia, o “precede”. O Espírito é, ao mesmo tempo, o Espírito do Pai e do Filho. Como Espírito do Pai é enviado à Virgem e como Espírito do Filho move esse para que deixe a encarnação produzir-se.
6. O dom do Espírito que Jesus recebe está também destinado à Igreja.
7. A santificação da humanidade de Jesus por obra do Espírito Santo no primeiro instante não é por isso posta em discussão. Jesus é desde a encarnação pessoalmente o Messias, o Cristo (cf. Lc 2,11; Mt 1,1.16-18). Mas só depois da nova efusão do Espírito e da manifestação aos homens no Jordão é que começa a exercer sua função messiânica.
8. O Espírito atua em Jesus, é a todo momento o guia de seu caminho histórico como Filho para o Pai. No Espírito, Jesus obedece em liberdade aos desígnios paternos. É o Espírito que impele Jesus ao deserto para ser tentado (cf. Mc 1,21; em Lc 4,1, Jesus dirige-se ao deserto “cheio do Espírito Santo”); no mesmo Espírito Jesus inaugura seu ministério (Lc 4,14); em virtude do Espírito de Deus, Jesus expulsa os demônios, marcando a chegada do Reino de Deus (cf. Mt 12,28; Mc 3,22.28-30; Lc 11,20); e, em virtude ainda do mesmo Espírito eterno, se oferece ao Pai na paixão e na morte (cf. Hb 9,14).
Sujeito ativo da unção
É antes de tudo o Pai que realiza essa unção. A identidade de Jesus como Filho põe-se nesse momento de manifesto, e a descida do Espírito Santo não pode ser separada da realização da obra que Jesus, como Filho de Deus, levará a cabo por encargo do Pai. O momento do batismo se faz assim capital para a revelação da filiação de Jesus, em plena identificação pessoal com a missão que o Pai lhe confiou.
No momento do batismo, o Espírito ainda não se manifesta plenamente como o Espírito do Filho. Essa manifestação terá lugar no momento da ressurreição.
É verdade que no momento mesmo do batismo de Jesus de alguma maneira já receberam o Espírito Santo todos os homens, enquanto o recebe Jesus, a “cabeça”. Mas nesse momento o dom a todos ainda não é efetivo. O Espírito ainda não revelou todas as suas virtualidades, não foi plenamente manifestado em seus efeitos como acontecerá em Pentecostes, depois da ressurreição e exaltação do Senhor à direita do Pai. Porém, o batismo do Senhor é um momento de manifestação de Jesus Filho em sua unção no Espírito por iniciativa do Pai, e por isso é um momento capital na história da manifestação do Deus trino.
3. A Cruz dentro do mistério Trinitário
Von Balthasar observa que, segundo o NT, Jesus entrega-se à morte por nós em obediência e acordo perfeito em “ser entregue”. Mas também do Pai se diz que entrega Jesus, seu Filho, e com isso mostra que nos ama (cf. Rm 8,32; Jo 3,16). Também Cristo nos ama (Rm 8,35; Gl 2,20; Ef 5,1), e quando se entrega à morte manifesta ao mesmo tempo seu amor e o amor do Pai por nós. Por isso “a teologia da entrega não admite outra armação do que a trinitária. Que Deus ‘entrega’ seu Filho deve ser entendido em um sentido forte, não só no de um ‘envio’ ou ‘dom’, senão que o Pai entregou totalmente Cristo ao destino de morrer. E no sofrimento de Jesus, na kênosis total, aparece a glória de Deus, “brilha a glória de Deus no rosto de Jesus Cristo” (2Cor 4,6).
O Pai entrega o Filho nas mãos dos pecadores, não se deleita no sofrimento de Jesus. Aceita a morte de seu Filho nas mãos dos homens porque respeita nossa liberdade e assim nos oferece a maior demonstração de seu amor. Deus Pai, o que gera o Filho, não pode querer diretamente sua morte. Não se pode aqui, como queria Moltmann, afirmar que, na cruz, o Pai e o Filho estão separados no mais profundo do abandono. Também não se deve dizer, ainda com ele, que o acontecimento da cruz produz uma profunda separação em Deus, porque Deus abandona Deus, contradizendo a si mesmo. Somente no Espírito é que acontecerá a unidade nas entregas do Pai e do Filho, segundo Moltmann. Ora, isso é um pouco da dialética de Hegel. Uma separação em Deus é impensável. Deus em si mesmo continua sendo Deus. A separação existente se dá no mistério de Deus enquanto homem. Portanto, é por causa da humanidade de Jesus que se dá a separação. Jesus Cristo enquanto Deus permanece, mesmo no mistério da cruz, na indivisibilidade substancial com o Pai e o Espírito Santo.
A entrega de Jesus à morte, que faz parte dos desígnios de Deus, encontra em Jesus não a rebelião, mas a plena correspondência. É por amor que tanto o Pai quanto o Filho e o Espírito Santo realizam as “entregas divinas”. Em Deus não existe um “conflito”, mas a manifestação da pura unidade e da comunhão divina.
A unidade da cruz e da glória, característica de João, permite-nos ver na imagem do crucificado a última interpretação de Deus a quem nunca ninguém viu (cf. Jo 1,18). Em Jesus crucificado, embora a luz da glorificação já se inicie nesse momento, acontece, por conseguinte, a máxima revelação de Deus.
Contemplando o mistério da cruz, somos também convidados a fazer de nossa vida uma verdadeira entrega aos desígnios de Deus para o nosso bem e para a salvação do mundo inteiro. Em cada entrega que realizamos está a possibilidade salvífica para quantos dependem deste gesto de amor.
4. A Ressurreição de Jesus Cristo, obra da Santíssima Trindade
4.1 Iniciativa do Pai15
@ ... a fé na ressurreição de Jesus não é um anexo da fé em Deus, é sua expressão da fé no Deus cristão. O poder de ressuscitar e o de criar, com certa prioridade para o primeiro, vão juntos segundo Rm 4,17.
4.2 Iniciativa também de Jesus – Jo 10,17; 2,19-21
@ Para o quarto Evangelho, o mistério pascal é a ida de Jesus ao Pai, que pôs tudo em suas mãos – Jo 13,1.3; 14,28; 20,17
@ A paternidade de Deus e a filiação divina de Cristo que se manifesta na ressurreição, que por sua vez oferece a chave de compreensão de toda a vida de Jesus, abrem a porta para a compreensão da Trindade imanente.
@ A filiação divina que Jesus vive neste mundo, e manifesta-se em plenitude na ressurreição, baseia-se, por conseguinte, no próprio ser divino, em uma relação com o Pai, prévia à sua existência humana16.
@ Só com a existência divina de Jesus prévia à encarnação pode ter a economia salvífica seu fundamento no ser mesmo de Deus, e assim a comunicação da vida de Deus aos homens.
@ Jesus é desde sempre o Filho de Deus, não chegou a sê-lo na ressurreição ou em algum momento prévio de sua vida moral.
4.3 Iniciativa do Espírito Santo.
@ O Espírito Santo intervém na ressurreição de Jesus17 – Rm 1,4 – O Pai ressuscita Jesus no Espírito. Esse Espírito de Deus que no AT é força criadora e que robustece o homem, é agora força de ressurreição (cf. Ez 37,5ss). E ainda Rm 8,11.
4.3.1- O Espírito, dom do Pai e de Jesus ressuscitado
@ Jesus em sua ressurreição recebe o Espírito em plenitude. Entre a missão de Jesus e a do Espírito Santo há uma relação intrínseca. Jesus, o Filho enviado ao mundo, é a fonte do Espírito para os homens.
@ Segundo Lc 24,39, Jesus enviará a promessa do Pai. Tal anúncio é repetido em At 1,5.8. Em At 2,1ss dá-se o cumprimento dessa promessa.
@ O envio do Espírito é atribuído a Deus Pai em At 2,17 e ao Filho em At 2,33.
@ O Espírito é visto assim como o dom escatológico, que além de impulsionar a evangelização dá a alegria do louvor a Deus (At 2,4.11). Para João, o dom do Espírito é consequência da glorificação de Jesus em sua humanidade.
@ O Espírito estava já presente em Jesus durante o tempo de sua vida mortal (cf. Jo 1,32-33), mas até sua glorificação não estava para ser doado. A doação do Espírito à Igreja e aos discípulos é consequência inseparável da glorificação do Senhor.
@ O Espírito procede do Pai, mas Jesus o enviará de junto do Pai (Jo 15,26). É Jesus ressuscitado quem dá o Espírito (cf. Jo 20,22).
- “Espírito de seu Filho”: Gl 4,6
- “Espírito de filiação”: Rm 8,15
- “Espírito de Cristo”: Rm 8,9; 1Pd 1,11
- “de Jesus Cristo”: Fl 1,19
- “do Senhor”: 2Cor 3,17
- “da vida em Cristo Jesus”: Rm 8,2
Santo Irineu: “[O Espírito Santo] realiza nos homens a vontade do Pai e os renova da velhice na novidade de Cristo”.
Orígenes: “Nosso Salvador, depois da ressurreição, quando o que era velho já havia passado e todas as coisas tinham sido renovadas, sendo ele mesmo o homem novo e o primogênito dos mortos (cf. Cl 1,18), e os apóstolos também renovados pela fé em sua ressurreição, disse: ‘Recebei o Espírito Santo’ (Jo 20,22). Isso, com efeito, era o que o mesmo Senhor e Salvador dizia no Evangelho (cf. Mt 9,17) quando negava que se pudesse pôr vinho novo em odres velhos, senão que mandava que se fizessem odres novos, quer dizer, que os homens caminhassem na novidade de vida (cf. Rm 6,4), para que recebessem o vinho novo, quer dizer, a novidade da graça do Espírito Santo”.
Hilário de Poitiers: “O profeta, com seu desejo, anuncia que Deus há de ser exaltado sobre os céus (cf. Sl 57/56,6). E porque depois de ter sido exaltado sobre os céus tiha de encher tudo com a glória de seu Espírito Santo, acrescenta (o salmista): ‘e tua glória sobre toda a terra’ (Sl 57/56,6). Porque o dom do Espírito derramado sobre toda a carne ia dar testemunho da glória do Senhor exaltado sobre os céus”.
Concílio Vaticano II: “Para que incessantemente nos renovemos nele (cf. Ef 4,23), concedeu-nos participar de seu Espírito, que sendo um só e o mesmo na cabeça e nos membros, de tal forma vivifica, unifica e move todo o corpo da Igreja que sua operação pôde ser comparada pelos Santos Padres com o serviço que realiza o princípio da vida, ou a alma, no corpo humano” (LG 7; cf. também AG 4).
4.3.2 – O dom do Espírito e seus efeitos depois da ressurreição de Jesus Cristo
Sinóticos e Atos
@ O Espírito é o inspirador dos profetas do AT. (cf. Mc 12,36 par; 1Pd 1,11).
@ Assiste nos momentos de perseguição (cf. Mc 13,11; Mt 10,19-20; Lc 12,11).
@ É o dom prometido por Deus para os últimos tempos18
@ É dom que habilita os Apóstolos para o testemunho em favor de Jesus Cristo19.
- Pedro dá testemunho no dia de Pentecostes (cf. At 2,1ss).
- Os que os escutam recebem, com o batismo, o Espírito Santo20 - O Espírito faz que Pedro dê testemunho ante o Sinédrio21
- Estevão fala perante seus acusadores, antes de ser lapidado, “cheio do Espírito Santo”22.
@ Torna universal a pregação dos apóstolos (cf. At 10,19).
@ Acompanha e precede a ação evangelizadora.
@ Assiste os apóstolos em sua função de guiar a Igreja (cf. At 15,28).
- Envia a pregar em um lugar (cf. At 13,2.4).
- Impede a ida a outro lugar (At 16,6.7).
- Faz indicações a Paulo, põe os pastores da Igreja (At 20,23.28).
@ Manifesta as maravilhas de Deus (cf. At 2,4.11; Lc 1,42.67; 2,25; 10,21).
@ Consolador da Igreja nascente (cf. At 9,31).
Cartas de São Paulo
@ Gl 4,6: “... e por serdes filhos, enviou a vossos corações o Espírito de Filho que clama e nós: Abbá, Pai!”.
@ Rm 8,14-17: “Todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Pois não recebestes um espírito de escravos para recair no temor, senão um espírito de filhos adotivos que nos faz exclamar: Abbá, Pai! O Espírito mesmo une-se a nosso Espírito para dar testemunho de que somos filhos de Deus. E se filhos, também herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo...”.
@ O Espírito Santo, Espírito de Jesus, cria em nós a atitude de filiação, o “espírito”dos filhos adotivos, contrário à atitude do escravo, que vive no temor.
@ A filiação traz consigo a herança, que é propriamente do Filho (cf. Hb 1,2), também para nós.
@ O Espírito é o penhor de nossa herança (cf. Ef 1,8.14; 4,30; 2Cor 1,22; 5,5; 8,23).
@ O Espírito é a garantia de nossa vida futura (cf. Rm 8,9-11).
@ O Espírito é adquirido pela fé (cf. Gl 3,1-2.5.14; 1Cor 12,2).
@ Faz-nos conhecer a Deus e ter a reta compreensão de sua palavra (cf. 1Cor 2,10-14; 2Cor 3,14-18).
@ Opõe-se à vida segundo a carne23.
@ Equivalência das expressões “no Espírito” e “em Cristo”24.
@ Dá-se no batismo (cf. 1Cor 6,11; 12,13; Tt 3,5).
@ Com Ele nos identificamos com Cristo morto e ressuscitado (cf. Rm 6,3ss; Cl 2,12).
@ Opera em nós a partir de dentro do nosso interior. Ele foi-nos dado por Deus. É o dom de Deus por excelência (cf. 1Ts 4,8).
@ Somos templos do Espírito Santo (cf. 1Ts 4,4-8; 1Cor 6,15.19; 3,16; Rm 8,9s).
@ A presença do Espírito tem uma dimensão eclesial (cf. 1Cor 12,4ss; Rm 12,4ss; Ef 4,11ss; Ef 1,23; 4,13).
Os escritos de João
@ O Espírito recebe duas denominações: o “Paráclito” e o “Espírito da verdade”.
- Enquanto ‘Paráclito’ (advogado, consolador; cf. Jo 14,16.26; 15,26; 16,7):
a. está sempre com os discípulos;
b. assiste-os no testemunho de Cristo;
c. Ele mesmo dá testemunho no interior de cada crente;
d. convencerá o mundo quanto ao pecado, à justiça e ao juízo, porque o mundo não acreditou em Jesus (cf. Jo 16,7ss).
- Enquanto “Espírito da verdade” (cf. Jo 14,17; 15,26; 16,13; 1Jo 5,6):
a. recorda aos discípulos o que disse Jesus;
b. anunciará a eles o que há de vir;
c. não fala por si mesmo, mas escuta Jesus, recebe do que é dele, e o comunica;
d. mantém viva entre os discípulos a palavra e a própria presença de Jesus;
e. “dá a vida” (cf. Jo 6,62);
f. é origem de um novo nascimento do homem (cf. Jo 3,3-8).
@ Introduz no verdadeiro conhecimento de Deus e de Cristo (1Jo 2,20ss).
@ É a garantia da reta confissão de Cristo (cf. 1Jo 4,2), e de permanência dos fiéis no amor (cf. 1Jo 4,12ss).
Conclusão: O Espírito nos é dado como o Espírito de Cristo e também de Deus. Ele universaliza e fez eficaz para todos os tempos e lugares a obra de Cristo, realizada em um momento e em um lugar determinados. Ao universalizá-la a atualiza, quer dizer, a faz presente, como acontece principalmente nos sacramentos. Ao atualizá-la, interioriza-a no homem, de maneira especial no crente. Mas a ação do Espírito não se limita ao âmbito visível da Igreja. A vontade salvífica de Deus não tem fronteiras, como tampouco a mediação de Jesus. Por isso a ação do Espírito também não pode conhecer fronteiras. O Vaticano II assim se expressa em GS 22:
“Isso vale não para os cristãos, mas também para todos os homens de boa vontade, em cujo coração a graça opera de modo invisível. Cristo morreu por todos, e a vocação última do homem em realidade é uma só, isto é, divina. Por isso devemos sustentar que o Espírito Santo oferece a todos a possibilidade de que,em uma forma que Deus conhece, sejam associados ao mistério pascal”.
4.3.3 – Caráter pessoal do Espírito Santo segundo o NT.
@ O Espírito Santo “não permite” a Paulo e Silas irem a Bitínia, ou pregarem a palavra na Ásia (cf. At 16,6.7).
@ Diz que separem a Barnabé e Paulo (At 13,2).
@ Adverte a Paulo das tribulações que o esperam (At 20,23).
@ Diz a Pedro que vá com os que o buscam da parte de Cornélio, porque ele os enviou (At 10,19).
@ Decide no Concílio de Jerusalém, juntamente com os apóstolos e os anciãos (At 15,28).
@ Encarregou de sua missão os presbíteros de Éfeso (At 20,28).
@Perscruta as profundezas de Deus e julga as coisas (cf. 2Cor 2,11.14).
@ Somos admoestados para não entristecer o Espírito Santo de Deus (cf. Ef 4,30).
@ É enviado (cf. Gl 4,6).
@ É enviado, ensina, recorda, dá testemunho, convence o mundo, dirá o que tiver ouvido (cf. Jo 14,16-17; 17,26; 15,16; 16,7-11.13-14).
@ Fala às Igrejas (cf. Ap 2,7-11; 14,13; 22,17).
5. A relação entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo no NT.
@ O Deus de Israel se revela no NT como o Pai de Jesus.
@ O unigênito, enviado de Deus, aparece unido ao Deus único na fé e na confissão: cf. Jo 17,3; 1Cor 8,6; 1Tm 2,5; Rm 10,9.
@ Jesus é chamado Deus no NT:
Jo 1,1: “No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus”.
Jo 20,28: “Tomé disse: ‘Meu Senhor e meu Deus!’”.
1Jo 5,20: “Nós sabemos que veio o Filho de Deus e nos deu a inteligência para conhecermos o Verdadeiro. E nós estamos no Verdadeiro, no seu Filho Jesus Cristo. Este é o Deus verdadeiro e a Vida eterna”.
Jo 8,24: “Disse-vos que morrereis em vossos pecados, porque se não credes que EU SOU, morrereis em vossos pecados”. Essa expressão “EU SOU”, própria de Iaweh, em Ex 3,14, é aqui aplicada também a Jesus por ele mesmo, como indicativo de sua divindade.
Jo 8,28: “Disse-lhes, então, Jesus: ‘Quando tiverdes elevado o Filho do Homem, então sabereis que EU SOU’”.
Jo 8,58: “Jesus lhes disse: ‘Em verdade, em verdade, vos digo: antes que Abraão existisse, EU SOU’”.
Jo 13,19: “Digo-vos isso agora antes que aconteça, para que, quando acontecer, creais que EU SOU...”.
Rm 9,5: “..., aos quais pertencem os patriarcas, e dos quais descende o Cristo, segundo a carne, que é acima de tudo, Deus bendito pelos séculos! Amém”.
Tt 2,13: “..., aguardando a nossa bendita esperança, a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador, Cristo Jesus,...”.
2Pd 1,1: “Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, aos que receberam, pela justiça de nosso Deus e Salvador Jesus Cristo uma fé de valor igual à nossa,...”
@ O Espírito Santo na relação trinitária
Mt 28,19: “Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”.
1Cor 2,10-12: “A nós, porém, Deus o revelou pelo Espírito. Pois o Espírito sonda todas as coisas, até mesmo as profundidades de Deus. Quem, pois, dentre os homens conhece o que é do homem, senão o espírito do homem que nele está? Da mesma forma, o que está em Deus, ninguém o conhece senão o Espírito de Deus. Quanto a nós, não recebemos o espírito do mundo, mas o Espírito que vem de Deus, a fim de que conheçamos os dons da graça de Deus”.
2Cor 3,17: “Pois o Senhor é o Espírito, e onde se acha o Espírito do Senhor aí está a liberdade”.
@ Jesus realizou, de modo definitivo, a obra da salvação: cf. Hb 7,27; 9,12; 10,10. E esta obra de Jesus alcança seus frutos nos homens pela ação do Espírito Santo.
@ Temos acesso ao Pai pelo Filho no Espírito Santo – cf. Ef 2,18
@ Existe uma linha que podemos chamar de ‘descendente’: Pai-Filho-Espírito Santo, de Deus ao homem, e outra ‘ascendente”: Espírito-Filho-Pai: o dom do Espírito enviado ao nossos corações une-nos a Jesus e por ele temos acesso ao Pai.
Textos indicativos da Trindade no NT
Mt 28,19: “Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. É um texto litúrgico.
2Cor 13,13: “A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós!”. É um texto também litúrgico.
1Cor 12,4-6: “Há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo; diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo; diversos modos de ação, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos”.
Gl 4,4-6: “Quando, porém, chegou a plenitude do tempo, enviou Deus o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob a Lei, para remir os que estavam sob a Lei, a fim de que recebêssemos a adoção filial. E porque sois filhos, enviou Deus aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: Abba, Pai!”.
Textos que exigem maior atenção
1Cor 6,11: “Eis o que vós fostes, ao menos justificados em nome do Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito de nosso Deus”.
Rm 8,14-17: “Todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Com efeito, não recebestes um espírito de escravos, para recair no temor, mas recebestes um espírito de filhos adotivos, pelo qual clamamos: Abba, Pai! O próprio Espírito se une ao nosso espírito para testemunhar que somos filhos de Deus. E se somos filhos, somos também herdeiros; herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo, pois sofremos com ele para também com ele sermos glorificados”.
Ef 2,18: “... pois, por meio dele, nós, judeus e gentios, num só Espírito, temos acesso ao Pai”.
Ef 4,4-6: “Há um só Corpo e um só Espírito, assim como é uma só a esperança da vocação a que fostes chamados; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; há um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos”.
2Ts 2,13-14: “Nós, porém, sempre agradecemos a Deus por vós, irmãos queridos do Senhor, porque Deus vos escolheu desde o princípio para serdes salvos mediante a santificação do Espírito e a fé na verdade, e por meio do nosso evangelho vos chamou a tomar parte na glória de nosso Senhor Jesus Cristo”.
Tt 3,4-7: “Mas, quando a bondade e o amor de Deus, nosso Salvador, se manifestaram, ele salvou-nos não por causa dos atos justos que houvéssemos praticado, mas porque, por sua misericórdia, fomos lavados pelo poder regenerador e renovador do Espírito Santo, que ele ricamente derramou sobre nós, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador, a fim de que fôssemos justificados pela sua graça, e nos tornássemos herdeiros da esperança da vida eterna”.
1Pd 1,2: “... eleitos segundo a presciência de Deus Pai, pela santificação do Espírito, para obedecer a Jesus Cristo e participar da bênção da aspersão do seu sangue”.
DEUS TRINO NO ANTIGO TESTAMENTO: PREPARAÇÃO DA REVELAÇÃO
@ O AT não nos dá um conhecimento profundo do Deus Trino, mas o indica. Em texto como Gn 1,26: “Façamos o homem”, há um sinal, mesmo que diretamente o autor não tenha pensado trinitariamente.
@ Em duas coisas podemos perceber os sinais trinitários: na revelação do nome de Deus e nas figuras de mediação.
Nome de Deus
“Disse Deus a Moisés: ‘Eu sou aquele que é’. Disse mais: ‘Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me enviou até vós’ ... Este é o meu nome para sempre, e esta será a minha lembrança de geração em geração”.
Entre os diferentes nomes de Deus no AT, o de “Javé” tem a primazia do nome revelado por Deus mesmo. Com esse nome, Deus se deu a conhecer. O nome de Javé indica assim a orientação futura das atuações de deus que estará com seu povo. Deus é ato puro, de modo que o ser e o atuar de deus se correspondem. Em seu agir concreto Deus dará a conhecer seu ser eterno e imutável, em si e para nossa salvação.
O nome de Javé equivale, pois, a “eu sou o que existo”, não no sentido da definição dogmática de um monoteísmo abstrato, mas no de um monoteísmo prático: Javé é para Israel o único que existe porque é seu único salvador. É o que fará sair o povo do Egito (cf. Ex 3,9-11). Daí a interpretação muito frequente do nome de Javé como “eu estarei convosco”. O que é Deus em si mesmo se conhecerá a partir do que será para seu povo. Em Mt 28,20, Jesus Cristo cumpre plenamente esse significado do “estarei convosco” quando afirma: “Eu estarei convosco todos os dias até o fim dos séculos”. O livro do apocalipse faz referência ao “Eu sou o existente”, quando diz: “Eu sou o Alfa e o Ômega, o que é, o que era, o que há de vir, o Todo-Poderoso” (Ap 1,8).
@ Israel celebrará uma aliança com Javé – cf. Dt 32,8-9; Sl 95/94,7.
- Exclusão da idolatria – Ex 20,2-3.
@ Monoteísmo radical25 – cf. Dt 4,35.39; 6,4; 7,9; Is 43,10-11.
Figuras de mediação
A transcendência de Deus é claramente uma constante no ensinamento do AT e sua atuação e presença no meio do povo constitui uma doutrina central. Deus transcendente e misericordioso se faz presente, ainda que não plenamente como em Jesus Cristo. Para tal, as mediações se tornam importantes neste estar presente de Deus no meio do povo, o que dizemos: “figuras ‘quase-divinas’ de mediação” ou quase “hipostasiadas”. Por hipóstase entendemos pessoa, numa linguagem grega. Portanto, é possível fazer uma interpretação dessas mediações como momentos de uma preparação mais explícita para a revelação do Deus trino no NT. A Palavra e a Sabedoria, de modo especial, serviram para interpretar a função salvífica e para afirmar a divindade de Jesus
@ Anjo de Javé
1. o que ajuda e guia Israel na saída do Egito e na peregrinação pelo deserto: cf. Ex 14,19; 23,20-23; 32,34; 33,2; Nm 20,16.
2. juiz e castigador: cf. 2Sm 14,17; 24,16ss.
3. É o enviado ao profeta Elias em sua peregrinação para o Horeb: cf. 1Rs 19,5ss; 2Rs 1,3.15.
4. não pode ser distinguido adequadamente de Deus:
- aparição a Agar: Gn 16,7.9
- aparição a Jacó: Gn 31,11.13
- aparição a Gedeão: Jz 6,11s.14
@ A Palavra de Deus
1. Palavra dirigida aos profetas, ouvida e transmitida ao povo: cf. Is 6,9; Ez 10,5; Jr 1,11; Am 1,4.7
2. Os profetas iniciam suas exortações com a expressão: “Assim fala Javé...”. Ou também: “foi dirigida a palavra de Javé...”. Palavra poderosa, irresistível, que domina o profeta: cf. Am 3,8; Ez 2,8ss; Jr 20,8ss.
2. É ensinamento, revelação, mandato do Senhor, é Mandamento: cf. Ex 20,1; 24,27s. Moisés é o primeiro a receber as palavras e encarregado de transmiti-las ao povo: cf. Ex 3,4; 4,2; 5,3. Por essas palavras o povo de Israel foi constituído “povo de Deus”: cf. Ex 24,8; 34,27.
3. A palavra é executora da vontade de Deus na criação e na guia do povo. Ela participa do poder divino: Sl 33/32,6; Sb 9,1; Gn 1,3ss; Is 48,13.
@ A Sabedoria divina
1. refere-se em primeiro lugar ao âmbito do reto agir humano, que só é possível se Deus concede. É por isso um bem divino: cf. Jó 12,13 – que o homem só pode conseguir como um dom de Deus pelo qual deve suplicar: cf. Gn 3,5ss; 1Rs 3,12; Pr 21,30.
2. faz-se presente na criação do mundo: cf. Jr 10,12; Pr 3,19; Sl 104/103,24; Pr 21,30; 1,7; 9,10.
3. aparece como “personificada”: cf. Pr 8-9; Eclo 24, 1-2; Sb 7,22-26.
4. aproximação entre as noções de sabedoria e espírito: cf. Sb 1,4-7.
@ O espírito
1. indica vento, o que não pode ser controlado pelo homem.
2. energia e poder divino, superior a toda força humana.
3. potência cósmica, força criadora de Deus:
- é o vento que Deus faz soprar, que retira as águas do mar Vermelho e abre a passagem para os israelitas: cf. Ex 14,21; 15,8.
- está a serviço da salvação do povo: cf. Ex 10,13.
- paira sobre as águas: cf. Gn 8,1 e retira as águas do dilúvio.
- enche a terra: Sb 1,7.
- importante para a vida em geral e do homem em particular, que depende sempre da ação de Deus: cf. Jó 27,3; 33,4; 34,14; Sl 104/103,29s.
4. força que irrompe em determinadas pessoas de maneira inesperada para a realização de empreendimentos diverso: cf. Jz 3,10; 6,34; 11,29; 13,25; 14,6.19; 15,14; 1Sm 10,6.10; 11,6. Invade alguns grupos de profetas: cf. 1Sm 10,10. Também pousa sobre Davi,e permanece sobre ele mais do que sobre seus predecessores: cf. 1Sm 16,13; 16,14; 2Sm 23,1-2. O Espírito opera nos profetas e a ele atribui-se a profecia mesma, sobretudo a partir do exílio: cf. Ez 22,2; 3,24; 11,1.5.24; Os 9,7; Zc 7,12; Is 63,11.
5. O Messias será o portador do Espírito: cf. Is 42,1ss; 28, 5ss.
6. O Servo de Javé também será o depositário desse dom: cf. Is 42,1ss; 61,1.
7. Os tempos messiânicos serão caracterizados por uma posso geral do Espírito, que já não sra o patrimônio de uns poucos: cf. Is 2,4-6; 44,2.
8. No profeta Joel a efusão do universal do espírito une-se aos acontecimentos do dia de Javé, irrupção definitiva de Deus na história, momento em que todos profetizarão: cf. Jl 3,1ss; At 2,17ss.
9. O Espírito é o começo de uma vida nova: cf. Ez 11,19; 18,31; 36,26s. Ele vivifica os ossos secos: cf. Ez 37,1-14.
10. Habita o interior do homem: cf. Sb 1,4-6; 9,17.
11. Há um processo de personificação. O Espírito de Deus vai sendo cada vez menos uma força passageira que irrompe em um homem em momentos de exceção, com uma ação exterior e esporádica, para converter-se em um princípio que, mantendo sua transcendência, se faz interior ao homem e ao povo para renová-lo em sua conduta e fazer possível a vida segundo Deus e segundo a aliança.
A TRINDADE E OS PADRES DA IGREJA
OS PADRES APOSTÓLICOS
A unicidade de Deus é uma constante fundamental do Novo Testamento, mas junto com essa afirmação o mesmo NT apresenta-nos, unidos ao Pai na obra salvífica e na fórmula batismal, o Filho e o Espírito Santo.
Os Padres apostólicos, sem, no entanto, terem uma perfeita elaboração trinitária, procuraram manifestar sua fé na Trindade do jeito que a compreendem no desenvolvimento do dogma em questão.
Encontramos algumas fórmulas triádicas nos Padres apostólicos, mas ainda insuficientes, não adequadamente elaboradas. Foi mais desenvolvida a relação Pai-Filho. Afirma-se a preexistência de Cristo à encarnação e inclusive é chamado “Deus” com alguma frequência. O Espírito é relacionado com a inspiração profética, com a concepção de Jesus e também como derramado sobre nós, alusão provável ao batismo.
1. Clemente Romano – (morto por volta de 100 d.C) - Carta aos Coríntios
@ “Por que há entre vós discórdias... Acaso não temos um único Deus, um único Cristo, um único Espírito de graça derramado em nós?”. Não se sublinha a unidade dos Três, mas que cada um é “único”.
@ “Porque vive Deus e vive o Senhor Jesus Cristo e o Espírito Santo, a fé e a esperança dos escolhidos”.
@ O Pai é chamado senhor da criação. A paternidade divina refere-se com frequência à criação: “Fixemos os olhos no Pai e Criador de todo o cosmo... Os céus movidos por seu governo...”. Relacionado a Cristo, só uma vez: “Fixemos os olhos no sangue de Cristo e reconheçamos que é precioso a Deus, seu Pai.”...
@ “Ao único Deus invisível, Pai da verdade, que nos enviou o Salvador e guia da incorruptibilidade, por meio do qual manifestou a verdade e a vida celeste...”.
@ Cristo preexiste à sua encarnação. O Espírito Santo já falava dele, e ele mesmo já fala no AT. Mas não se trata de uma noção muito precisa da preexistência. O Espírito Santo, como já vimos, foi derramado sobre os cristãos. Falou no AT; também Paulo e o próprio Clemente escrevem guiados pelo Espírito. Porém não há fórmulas claras sobre a divindade do Espírito Santo.
2. Inácio de Antioquia (morto por volta de 110 d.C)
@ “... esforçai-vos em permanecer firmes... na fé e no amor, no Filho, no Pai e no Espírito, no princípio e no fim. Submetei-vos ao bispo e também uns aos outros, como Jesus Cristo ao Pai, segundo a carne, e os apóstolos a Cristo, ao Pai e ao Espírito”.
@ “Os cristãos são pedras do templo do Pai, dispostos para a edificação de Deus Pai, elevados ao alto pelo máquina de Jesus Cristo na cruz, e ajudados pelo Espírito Santo que é a corda...”.
@ Jesus Cristo é chamado diretamente de “Deus” em algumas ocasiões, é também “o conhecimento (gnósis) de Deus”.
@ Quanto à processão: “Jesus Cristo saiu de um só Pai” e a seguir especifica-se que Deus se manifestou por meio de Jesus Cristo, que é sua Palavra saída do silêncio.
@ O Espírito Santo está presente na geração na geração humana e na unção de Jesus.
3. Epístola do Pseudo-Barnabé (final do séc. I, início do séc. II)
@ Conhece a preexistência de Cristo à encarnação – Gn 1,26: “Façamos...”
@ Duas vezes Jesus é chamado de o “Amado”.
@ Ele é também o “Kyrios”.
@ O Espírito provém da fonte abundante do Senhor – talvez alusão ao batismo.
@ Ao Espírito a profecia.
4. Didaché (final do séc. I)
@ Fórmula batismal – Mt 28,19.
@ As orações da celebração eucarística dirigem-se ao Pai por Jesus Cristo.
@ Cristo é apresentado como o “servo”.
@ Exceto Mt 28,19, não há menção ao Espírito.
5. O “Pastor” de Hermas (primeira metade do séc. II)
@ Parece identificar o Espírito e o Cristo preexistente.
@ “O Espírito, preexistente, habitou na carne sem se corromper”.
@ “O Espírito viveu bem e piamente e se esforçou junto ao Espírito Santo”.
@ “Deus agradou-se da conduta humana dessa carne, porque quando tinha o Espírito Santo na terra, não o manchou. Tomou por conselheiro o Filho...”.
@ É uma reflexão trinitária e cristológica insuficiente.
OS PADRES APOLOGETAS
@ Começa agora, lentamente, na Igreja, a reflexão trinitária propriamente dita.
@ Ênfase dada à doutrina do Logos.
@ Defesa da fé.
@ Expor a coerência do cristianismo, mediante esforço especulativo.
@ Inicialmente, a reflexão nas relações Pai-Filho; depois, lentamente, introduz-se o Espírito Santo.
@ Têm como limite a falta de clareza sobre a “eternidade” da geração.
@ A teologia sobre o Espírito Santo é bastante imprecisa.
1. Justino
@ O mais significativo do apologetas.
@ Deus é sempre do mesmo modo, invariável, e causa de tudo quanto existe.
@ Deus é, ao mesmo tempo, o “Pai do universo, ingênito, não tem nome imposto.
@ A menção ao Pai está acompanhada pela menção ao Filho.
@ A geração do Filho está ligada à criação: o Verbo veio à existência quando Deus criou todas as coisas por seu meio.
@ O Verbo é gerado intelectualmente pelo Pai e por vontade deste.
@ O Espírito Santo aparece como sendo o Espírito profético e que adejava sobre as águas – constitui o terceiro lugar na ordem trinitária.
Justino tem uma visão limitada da Trindade.
2. Taciano
@ A geração não significa separação em Deus – o monoteísmo se mantém.
@ O Verbo é obra primogênita do Pai – por vontade da simplicidade do Pai.
@ O Pai não fica diminuído com a geração do Verbo, porque não é um corte físico, mas uma participação no seu ser.
@ Definição de Deus como Espírito: “O Verbo celeste, espírito que vem do espírito e Verbo da potência racional, à imitação do Pai que o gerara, fez o homem imagem da imortalidade...”.
@ A condição espiritual de Deus é participada pelo Verbo que possui a mesma “natureza” de Deus.
@ Além do “Deus espírito”, há o “Espírito de Deus”. Porém não se relaciona esse Espírito com o Pai e o Filho. Portanto, em Taciano, temos uma espécie de “binitarismo”.
Em Taciano, a Trindade continua sem definição legítima.
3. Atenágoras
@ A unidade do Pai e do Filho encontra-se fortemente acentuada.
@ O Verbo não é criado, porque Deus é sempre racional.
@ Há uma alusão ao Logos imanente que existe em Deus antes da geração.
@ O Espírito Santo não é diretamente chamado Deus: não aborda sua processão.
@ Unidade na potência, na dynamis; distinção na “ordem”, na táxis.
@ O Espírito age profeticamente – convicção comum na época.
Em Atenágoras, a Trindade ainda tem muito a se desenvolver.
4. Teófilo de Antioquia
@ O Espírito como a Sabedoria divina – ligação com a inspiração da Escritura.
@ A paternidade de Deus refere-se à criação.
@ Afirma a monarquia e a unicidade de Deus.
@ Fala do Logos imanente: no seio do Pai, antes da geração propriamente dita; e do Logos proferido: quando Deus o gera para criar o mundo por seu meio.
@ Salva, em parte, a eternidade do Logos divino.
@ Elimina a dificuldade que poderia supor que o Pai antes da geração estivesse sem razão e sem sabedoria.
Visão trinitária insuficiente ainda.
Curso em continuação
Notas de rodapé
1 Este curso terá como um dos livros base, “O Deus vivo e verdadeiro” de LADARIA, Luis F.
2 BALTHASAR, Teodramática III. El hombre en Cristo, Madrid, 1993, 467.
3Mc 12,26.29; Dt 6,4s; Mt 4,10; 1Cor 8,6; 1Tm 2,5; Jo 5,44; 17,3
4Dt 3,5s; Is 63,16; 64,7; Jr 3,4
5cf. Ex 4,22s; Dt 14,1s; 32,5; Sl 103,13.
6Is 1,2s; 30,1.9; Jr 3,4.19.22; Os 11,1.
7Pr 3,12; Sb 2,16; 11,10; Eclo 23,1.4; Sb 14,3
8Jo 5,36-37; 6,44.57; 8,18; 12,49; 14,24
9Jo 8,42; 13,3; 16,17-28
10Jo 3,16s; 1Jo 4,7-21
11Jo 5,26; 6,57
12 cf. Rm 1,3s; Fl 2,11; At 2,14ss; 13,32-34
13 cf. 2Cor 1,2s; Gl 1,3s; 1Ts 1,1-3; 3,11-13; 2Ts 1,1; 2,16
14 Santo Inácio de Antioquia diz que “o Senhor tomou ungüento sobre seu cabelo para inspirar incorrupção à Igreja”. Santo Irineu, fazendo menção direta ao batismo no Jordão, afirma que quando o Verbo de Deus era homem, da raiz de Jessé e da descendência de Abraão, o Espírito de Deus descansava sobre ele e o ungia para evangelizar os pobres. “O Espírito do Senhor desceu sobre ele, o Espírito daquele que tinha anunciado por todos os profetas que ia ungi-lo para que nós fossemos salvos ao receber da abundância de sua unção”.
15Rm 6,4; 8,11; 10,9; 2Cor 4,14; Ef 1,20; At 2,23-24; 3,5; 4,10; 10,39; Jo 12,23.28; 13,31-32; 17,1.5
16 Jo 1,1s; 8,58; 17,5.24; Rm 8,3; Fl 2,6; Gl 4,4; Ef 1,3ss; Hb 1,2
171Tm 3,16; 1Pd 3,18; Rm 1,3-4
18cf. Lc 24,49; At 1,4; 2,16ss; 2,33.39.
19cf. At 2,36; 1,8; 2,32; Lc 24,46-49.
20cf. At 2,38.
21cf. At 4,8; 5,32
22At 7,55; 6,5
23Rm 8,2-5.9.12-13; Gl 5,14-25;
24 Rm 8,1-14; 8,9; 1Cor 6,11; Ef 2,21-22; Gl 2,17 comparado com 1Cor 6,11; 2Cor 2,17; 1Cor 12,3; Fl 3,1; Rm 14,17.
25 Segundo H. VORGRIMLER, o monoteísmo em Israel passou pelas seguintes etapas: primeira: marcada pela luta contra o deus Baal, no século IX a.C., iniciada pelo profeta Elias; só se deve adorar Javé. Segunda etapa: marcada por Oséias, por volta de 740 a.C.: deve-se adorar Javé desprezando os outros deuses. Terceira etapa: a da reforma cultual de Ezequias (728-699) caracterizada pela luta contra o culto às imagens no reino do Norte. Quarta etapa: a da reforma de Josias (641-609) com a centralização do culto em Jerusalém; Sofonias, Ezequiel e Jeremias comprometem-se nesse movimento monoteísta. Quinta etapa: depois de 586: com o exílio irrompe o monoteísmo; não há outro Deus que Javé, em termos absolutos; assim dizem o Deuteronômio e o Dêutero-Isaías. (O DEUS VIVO E VERDADEIRO, LADARIA, pg. 126). Poderíamos até resumir dizendo que Israel antes foi politeísta, depois passou a acreditar num único Deus para ele, e mais tarde, depois do exílio, refinou sua crença, passando a compreender Deus como Um e único no universo inteiro.
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